Entrevista realizada a Gisela García Rivera, Diretora da África Subsariana do MINREX (Ministério das Relações Exteriores de Cuba) e ex-Embaixadora de Cuba em Angola no contexto da jornada comemorativa pelo 40 aniversário do massacre de Cassinga
¿Que conotação tem para Cuba a comemoração do aniversário do genocídio perpetrado por forças da África do Sul do apartheid, no acampamento namibiano em Cassinga?
A comemoração deste 40 Aniversário do Massacre de Cassinga tem uma elevada significação patriótica para o povo cubano e os irmãos africanos.
Com o pretexto de que eram combatentes da SWAPO, esse fatídico 4 de Maio de 1978 foram masacrados ao redor de 600 pessoas, na sua maioria meninos, mulheres e idosos. Foi um crime imenso, um genocídio dos racistas sul-africanos e uma página de vergonha para a imprensa internacional que praticamente fêz silêncio absoluto perante tal genocidio.
Cassinga é uma comuna do sul de Angola, do município Jamba, província da Huila, que albergava nesses momentos um centro de refugiados namibianos. Angola realmente deve receber o reconhecimento que merece por toda a ajuda que deu aos países da região na luta contra o colonialismo, o racismo e o apartheid. Seu território foi destroçado em acções como a de Cassinga, de terra arrasada, com um alto custo en vidas de civis, e toda sua infra-estrutura destruída.
Também não devemos esquecer que uma unidade cubana, ubicada em Tchamutete, viajou de imediato para ajudar os namibianos, baixo o ataque aéreo inimigo. Ainda estão em Tchamutete as campas que um dia guardaram os restos mortais dos nossos irmãos tombados em Cassinga.
Esta, é uma das tantas páginas escritas pelos internacionalistas cubanos na África. Realmente acho que a história da heróica solidariedade de Cuba com a África ainda não se conhece suficientemente. Como expressasse Fidel “essa gloriosa página da nossa história revolucionária merece ser conhecida, ainda que só seja como estímulo às centenas de milhares de homens e mulheres, combatentes internacionalistas, que a escreveram, para exemplo das presentes e futuras gerações”. Por isso nos sentimos tão contentes com a decisão do governo de Cuba de comemorar o 40 aniversário do massacre com um acto solene e uma jornada nacional.
Você fazia referência ao internacionalismo como princípio da política exterior cubana no continente africano ¿Quais foram os elementos principais desta política internacionalista?
O internacionalismo, o anti-imperialismo, a solidariedade entre os povos, são princípios que certamente guiam a nossa política exterior desde o triunfo da Revolução em 1959. Na base de todos eles está o sentimento profundamente humanista do nosso processo revolucionário e a nossa visão do mundo que queremos.
Seria bom colocar que Cuba teve uma contribuição importante no apoio às lutas pela independência, a defesa da soberania de nações do terceiro mundo, em particular em Africa, o fim do apartheid, e esse apoio não só se enquadrou na ajuda militar. Neste ano celebramos o aniversário 55 do início da cooperação médica cubana internacionalista na República Argelina Democrática e Popular. No ano de 1965, no Congo Brazzaville, junto aos guerrilheiros cubanos, havia médicos. Com os primeiros combatentes que foram a Angola no ano de 1975, foi também pessoal da saúde.
E depois têm sido exércitos completos de batas brancas, de construtores, de professoress, que têm estado, nas circunstâncias mais difíceis, no meio da guerra, das epidemias como a Ébola, em circunstâncias de desastres naturais. Foram civis da cooperação os heróis da batalha de Sumbe e neste ano comemoramos também o 40 aniversário do destacamento pedagógico Che Guevara.
Mas quiçá uma das páginas mais formosas e comoventes que mostram a essencia humanista da Revolução Cubana esteve relacionada com os factos de Cassinga. Centenas de meninos sobreviventes ou feridos foram transladados a Cuba para sua recuperação e posterior incorporação em escolas onde receberam educação primária, e media. Alguns se graduraon depois nas universidades cubanas.
Temos um caso muito encorajador para Cuba e foi a designação em 2006 de Claudia Grace Uushona como Embaixadora da Namiba em Cuba.
A hoje Embaixadora da Namibia em Angola considera-se, ela mesma, um fruto da Revolução Cubana. Nas suas palavras quando o Ministro Bruno Rodríguez lhe impunha a Ordem da Solidariedade, disse que à Revolução Cubana devia sua vida, recordou como sendo uma menina foi resgatada pelos combatentes internacionalistas cubanos a 4 de Maio de 1978. Apontou que graças à generosidad de Fidel foi trazida a Cuba, onde recebeu tratamento médico, cresceu e recebeu educação.
Esses pequenos uniram-se aos milhares de meninos e jovens de todos os mais “escuros cantos” do mundo tiveram e têm em Cuba a sua segunda pátria, que os abrigou e os educou, para depois regressar a suas pátrias como homens e mulheres de bem. Hoje vemos que entre eles há primeiros, ministros, artistas de renome, profissionais reconhecidos. Seria muito raro ver gabinetes ministeriais em países africanos onde não tenha alguém que estudou em Cuba. Esse é o legado do Comandante- em- Chefe.
¿Na actualidade, como se desenvuelven as relações de Cuba com Namibia e Angola? ¿Que perspectivas se apresentam para os próximos anos?
As relações com Namibia são excelentes, baseadas na amizade, solidariedade e a cooperação. São relações de países irmãos. Namibia não esquece o apoio internacionalista de Cuba a sua independência. . Uma dirigente amiga namibiana dizia-nos que a relação com Cuba é um tema de consenso nacional no seu país, independentemente de qualquer outro. Cada ano a Namibia é quem apresenta perante a União Africana a resolução contra o bloqueio dos Estados Unidos a Cuba. Albergou no passado ano o V Encontro Continental Africano de solidariedade com Cuba, em Windhoek, com a Palavra de ordem: "Intensificar a solidariedade com Cuba e preservar o Legado de Fidel e do Che".
Ao igual que com Angola, são laços indestructibles, baseados no sangue e o suor derramado Neste ano é também o 30 aniversário da batalha de Cuito Cuanavale, sobre a qual o atual presidente angolano João Lourenço disse que “o sangue derramado pelos combatentes cubanos em Angola, continua a regar a árvore que queremos cada vez frondoso, da eterna amizade entre nossos povos, nossas Forças Armadas, nossos paises.
Mantemos com ambos os países uma cooperação ampla e diversificada. Com Angola temos projectos bilaterais em 13 sectores (saúde, educação, educação superior, água, energia, defesa e segurança, construção, comunicação social, agricultura, pescas, cultura; mineração e petróleo). Ultrapassam os 2000 os nossos cooperantes distribuídos por toda a geografia angolana. Na Namibia temos 111 colaboradores, de seis sectores, sendo maioria os da saúde. Os nossos governos mantêm uma forte vontade política de continuar a fortalecer e a aprofundar os nossos vínculos bilaterais.
Neste 40 aniversário do massacre de Cassinga, e quando nos preparamos todos a celebrar de conjunto no Dia de Africa, gostaria de terminar com uma recente frase do Vice-presidente do Conselho de Estado Salvador Valdés Mesa num encontro com o Vice-presidente da União Africana, Excmo. Sr. Thomas Kwesi Quartey, que na minha opinião mostra de uma maneira muito singela a consistência e perspectivas da nossa política exterior para este continente, “No meio de todas as dificuldades, não deixaremos de ser solidários, sobretudo com Africa ”.
